segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Chico Science e Nação Zumbí- Afrociberdelia (1996)



Nome:Afrociberdelia
Ano:1996
Produção:Eduardo BID e Chico Science e Nação Zumbí
Músicos: Chico Science (vocal), Dengue (baixo), Lúcio Maia (guitarras), Pupilo (bateria), Jorge du Peixe (alfaia), Toca Ogan (alfaia), Gilmar Bola 8 (alfaia), Gira (alfaia), Marcelo Lobato (teclados), Lucas Santana (flauta), Gustavo Didalva (percussão), Hugo Hori (flauta e sax), Tiquinho (trombone), Bidinho (trumpete e flugelhorn), Sérginho Trombone (trombone), Eduardo Bid (guitarra dub), Fred 04 (cavaquinho)
Faixas:
1.Mateus Enter
2.O Cidadão do Mundo
3.Etnia
4.Quilombo Groove
5.Macô
6.Um Passeio no Mundo Livre
7.Samba do lado
8.Maracatu Atômico
9.O Encontro de Issac Asimov com Santos Dumont no Céu
10.Corpo de Lama
11.Sobremesa
12.Manguetown
13.Um Satélite na Cabeça
14.Baião Ambiental
15.Sangue de Bairro
16.Enquanto o Mundo Explode
17.Interlude Zumbi
18.Criança de Domingo
19.Amor de Muito
20.Samidarish
21.Maracatu Atômico (Atomic Version)
22.Maracatu Atômico (Ragga Mix)
23.Maracatu Atômico (Trip Hop)

Quando as coisas começam a ficar todas iguais, tem que surgir algo para diversificar. Quando na década de 90 o pop rock que era a cara do rock brasileiro desde a década de 80 começou a se tornar um ciclo de repetições eis que surgiram os Caranguejos com Cérebro e o movimento Mangue Beat. Resumindo, o Mangue Beat foi um movimento cultural/estilo de música que misturou a música regional nordestina - mais precisamente a pernambucana - com elementos do rock e da música eletrônica (tá vendo como essa de misturar música regional com rock sempre dá certo?). Os principais expoentes do movimento foram o Mundo Livre S/A e o Chico Science & Nação Zumbí e seus respectivos líderes Fred 04 e Chico Science. Para não desvirtuar o texto, vamos direto ao álbum e a banda. Na época desse disco, Nação Zumbí tinha uma verdadeira orquestra percussiva que contava com o atual vocalista do grupo Jorge du Peixe, Toca Ogan, Gira e Gilmar Bola 8 nas alfaias além da bateria do recém-chegado Pupilo. Somavam-se a eles o baixo grooveado de Dengue e a guitarra pesada e suingada de Lúcio Maia. À frente da banda estava a cabeça pensante de Chico Science, indiscutivelmente um dos grandes gênios da música brasileira e que tinha uma voz inconfundível (infelizmente, Chico Science veio a falecer em um acidente de carro no dia 2 de Fevereiro de 1997). O nome "Afrociberdelia", segundo o encarte, vem da união de África + Cibernética + Psicodelia e para abrir o álbum temos "Mateus Enter", uma verdadeira apresentação que faz-se de ponte para "Cidadão do Mundo" que julgo ser o verdadeiro retrato do "Mangue Boy". A música traz um timbre de bateria que parece ser eletrônica, os grooves de Dengue e conta ainda com efeitos digitais e berimbau. A terceira faixa, "Etnia", traz na letra genial de composição do Chico falando sobre miscigenação da qual nos originamos e da igualdade entre elas e tem a sonoridade típica do grupo, contando ainda com os sopros. "Quilombo Groove" é uma passagem instrumental que podemos classificá-la como uma "Moby Dick"(canção do grupo Led Zeppelin) à la Mangue Beat. Outra ilustre canção e clássico do banda que dá continuação ao álbum é "Macô", com a intro de "A Minha Menina", a participação de Gilberto Gil e Marcelo D2 nos vocais e a fenomenal linha de flauta de Hugo Hori. Lucio Maia abre a próxima canção com sua guitarra no melhor estilo samba rock e é acompanhada pelas alfaias e pelo baixo de Dengue que se não é está com uma timbragem próxima de um acústico. A letra de "Um Passeio no Mundo Livre" mostra a visão de Science de um lugar onde pode-se ser livre, talvez seja uma Olinda que ele mesmo criou. Os músicos da Nação Zumbí ainda homenagearam o samba em "Samba de Lado" que conta com a participação de Fred 04 no cavaquinho. Bom...O que falar de "Maracatu Atômico"? Às vezes quando ouço esta versão (a primeira de quatro presentes no disco) me questiono se Mautner e Jacobina não compuseram esta música uns bons 30 anos antes para o Nação gravar. Nem a versão do Gil, nem a do Mautner chegaram perto da versão do Nação, por melhores que sejam. Uma canção bem intrigante é "O Encontro de Isaac Asimov Com Santos Dumont No Céu", canção de curta duração, com Dengue mais uma vez usando o acústico e a banda explorando os efeitos eletrônicos. Mais um clássico do grupo, "Corpo de Lama", fala na letra de não irmos pelas aparências e no fim ainda traz uma mensagem sobre honestidade. Em "Sobremesa", Chico mistura inglês com português mais alfaias, guitarra com wah e um baixo bem escondido. Junto de "Maracatu Atômico", a próxima faixa é o maior clássico da banda. A faixa "Manguetown" tem um ar mais pop e ilustra uma cidade erguida sobre o mangue e mostra o belo casamento dos instrumentos de cordas com a percussão, sendo essa uma canção mais "crua", pelo fatos dos únicos efeitos presentes serem os da guitarra. Pandeirolas e distorção são as principais características da faixa 13, "Um Satélite na Cabeça". Mais uma instrumental, de autoria de Dengue, Gira e Lucio Maia, a faixa "Baião Ambiental" mistura o tradicional baião a um grande número de efeitos eletrônicos. Em "Sangue de Bairro" a banda faz uma "pedrada" em homenagem aos cangaceiros do bando de lampião e diga-se de passagem: haja fôlego, Chico Science! "Enquanto o Mundo Explode" é o tipo de música para banda de black metal nenhum botar defeito. Imagine se o baterista de uma banda como o Slayer trocasse o pedal duplo pelos tambores de maracatu? Sem falar da fantástica e pesada letra anticapitalista. Depois há "Interlude Zumbi", uma faixa curta homenageando o grande escravo guerreiro com berimbaus e batuques. O disco segue com "Criança de Domingo", uma canção mais calma conta que com violão, alfaias e uma guitarra distorcida vez ou outra, depois vem "Amor de Muito", com a melodia nos melhores moldes de "A Minha Menina" e com a guitarra soando bem psicodélica e percussão e baixo em perfeita harmonia, ainda podemos ouvir no fundo o teclado de Marcelo Lobato e depois o belíssimo arranjo de sopro. Quase no fim, entra a instrumental "Samidarish", canção que traz um clima bem pacífico, estilo música oriental, mas, claro, com todo o toque Mangue Beat do grupo. Com 2:30 de música, começamos a ouvir um diálogo entre os membros devaneando sobre o dinheiro e sua sujeira. O disco finaliza-se com mais três versões remixadas e bem distintas de "Maracatu Atômico". A primeira é a "Atomic Version" e nessa versão o ritmo da bateria está mais acelerado e ouve-se diferentes efeitos sonoros harmônicos. Depois entra a versão "Ragga Mix", adicionando-se vários efeitos e transformando a música numa levada ragga. Por último, a versão "Trip Hop", contando com bastante scratches e efeitos na voz do Chico. Afrociberdelia ocupa o 18º lugar na lista dos 100 maiores álbuns de música brasileira feita pela revista Rolling Stone e é junto de seu antecessor, Da Lama ao Caos (1994) um dos álbuns fundamentais para entender a estética e proposta do Mangue Beat, um movimento de importância riquíssima para a música e a cultura brasileira não tão reconhecido.